A abolição do comércio transatlântico de escravos no século XIX não significou o fim da escravidão no mundo. Embora oficialmente extinta, essa prática assumiu novas formas e permanece presente em diversas partes do planeta. Hoje, manifesta-se por meio do trabalho forçado, da servidão por dívida, do tráfico de pessoas, da exploração sexual, da escravidão doméstica, do casamento forçado, do trabalho infantil e de outras situações que negam a liberdade e a dignidade humana.
Essa realidade evidencia que a escravidão moderna é um crime que continua a afetar milhões de pessoas e que exige vigilância constante e ação global coordenada. Aqueles que praticam, toleram ou se beneficiam dessas violações devem ser responsabilizados judicialmente, enquanto as vítimas e sobreviventes têm direito à reparação e à justiça.
A preocupação internacional com o tema levou à criação de diversos instrumentos jurídicos de proteção. Um dos mais importantes é o Protocolo para Prevenir, Reprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, especialmente Mulheres e Crianças, adotado em 2000 e em vigor desde 2003, como parte complementar da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Esses mecanismos reforçam o compromisso global de combater as formas contemporâneas de escravidão.
Tribunais internacionais também têm desempenhado papel decisivo nesse enfrentamento. O Tribunal Internacional de Justiça reconheceu a escravidão como crime contra a humanidade, e o direito de não ser submetido à escravidão é considerado tão essencial que qualquer Estado pode acionar judicialmente outro que viole esse princípio. O Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia tipificou a escravidão sexual como crime contra a humanidade, e o Tribunal de Justiça da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) reafirmou essa mesma interpretação em decisão recente.
No Brasil, a escravidão foi oficialmente abolida em 13 de maio de 1888, com a assinatura da Lei Áurea, após séculos de exploração do povo negro. No entanto, práticas semelhantes à escravidão ainda persistem, em especial no meio rural e em cadeias produtivas que se aproveitam da vulnerabilidade social e econômica de grupos marginalizados.
Com o objetivo de reforçar o compromisso internacional de erradicar todas as formas de exploração humana, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu o Dia Internacional para a Abolição da Escravatura, celebrado em 2 de dezembro. A data remete à Convenção das Nações Unidas para a Supressão do Tráfico de Pessoas e da Exploração da Prostituição de Outros, de 1949, um marco histórico no combate à escravidão moderna.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), mais de 40 milhões de pessoas vivem atualmente em condições de escravidão moderna em todo o mundo. Destas, 71% são mulheres e meninas, e 25% são crianças. Essa forma de exploração movimenta cerca de 32 bilhões de dólares por ano, demonstrando que, mais do que um problema social, trata-se de uma grave violação de direitos humanos sustentada por interesses econômicos ilícitos.De acordo com o defensor público Dr. Julio Duailibe Salem Filho, coordenador do Núcleo da Cidadania e Direitos Humanos (NUCIDH), “as práticas contemporâneas de escravidão se manifestam de várias maneiras — tráfico de pessoas, inclusive de crianças, exploração sexual, trabalho e casamento forçados, servidão por dívida e outras formas de subjugação”.

Ele ressalta que o combate a esse tipo de violação exige não apenas punição, mas também políticas públicas de prevenção, proteção e acolhimento. “É preciso fortalecer políticas sociais e econômicas que garantam direitos fundamentais e reduzam a vulnerabilidade das populações em risco, impedindo que sejam atraídas ou forçadas a condições subumanas de exploração”, acrescenta.
O enfrentamento à escravidão moderna é responsabilidade de toda a sociedade. No Brasil, denúncias de situações análogas à escravidão podem ser feitas de forma anônima pelo Disque 100 ou pelo site da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.
💭A escravidão foi oficialmente abolida há mais de um século, mas ainda sobrevive nas sombras — nos campos, nas fábricas, escritórios, mundo corporativo, nas casas e nas rotas do tráfico humano. Se o mundo reconhece que ninguém deve ser tratado como propriedade, porque milhões de pessoas ainda vivem sem liberdade? Erradicar a escravidão moderna exige mais do que leis: exige consciência, coragem e a disposição de enxergar o que muitos preferem ignorar. 💭
FONTES:
02 de dezembro: Dia Internacional para a Abolição da Escravatura | Defensoria Pública do Paraná
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Conteúdo elaborado para: ObservAJUS – Observatório de Acesso à Justiça
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